Logo cedo, o cheirinho de pão toma conta das mais de 60 mil padarias do país. Em algumas, o pãozinho francês dá lugar a croissants, baguetes e bolinhos sofisticados. Quase sempre com produção artesanal – sem uso de fermento químico – e ingredientes orgânicos, as padarias gourmet começam a ganhar força no mercado.
Dominado por pequenas empresas, este mercado faturou, em 2011, 62,9 bilhões de reais, com um crescimento de 11,8% em relação a 2010, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria (Abip). Cresceu também o valor médio gasto nas padarias brasileiras, que pode ultrapassar os 26 reais.
Segundo a Abip e a Propan, o consumo per capita de pão, incluindo aí os industrializados, chega a 33,5 quilos por ano. Os custos fixos de uma padaria podem chegar a 77% do lucro bruto e a matéria-prima representa, em média, 25% a 41% do preço de venda dos produtos.
São Paulo, onde as padarias gourmet começam a crescer, é o estado que concentra o maior número de padarias. Neste ano, a chegada da rede belga Le Pain Quotidien aqueceu ainda mais o ramo.
Aparentemente simples, o negócio de padaria mais artesanal exige capital e mão de obra qualificada. A matéria-prima quase sempre é importada, a fermentação natural pode levar mais de 12 horas – contra 1 hora do uso de fermento químico -, e os funcionários precisam ser especializados. Veja nas fotos das próximas páginas seis empreendedores que faturam com padarias artesanais.
Le Vin Boulangerie: foco em restaurante
Francisco Barroso, proprietário do Le Vin, conta que quando inaugurou o bistrô, em 2000, os pães eram produzidos na cozinha do estabelecimento, para evitar problemas com entrega e qualidade dos produtos. Ele aproveitou oportunidades de imóveis no bairro dos Jardins, em São Paulo, e inaugurou o Le Vin Boulangerie em 2008. Hoje, o estabelecimento produz diariamente pães artesanais com fermento natural para os seus bistrôs e para outros 25 clientes comerciais, entre restaurantes e delicatessens.
Mensalmente, 800 quilos de farinha branca mais 600 quilos do tipo integral se transformam em macarrons, croissants e baguetes. Segundo ele, o faturamento médio mensal da boulangerie é de 150 mil reais. Barroso diz que o mercado de padarias artesanais tem espaço para crescer, desde que os produtos sejam de qualidade, o que exige gastos com matéria-prima e máquinas.
As expectativas do empresário é de levar os seus pães para os shoppings centers localizados nos arredores de sua boulangerie. “Têm que ser lugares próximos do centro de produção, para que eu possa oferecer uma mercadoria com frescor”, explica. Até o final do ano, ele conta que sairá o primeiro piloto do negócio, que será no formato de quiosques, e oferecerá pães, doces e cafés.
Le Pain Quotidien: rede internacional
Criada no final da década de 1980, a rede de padarias belga Le Pain Quotidien foi trazida ao Brasil pelos empresários Xavier Pipart e Ricardo Rinkevicius, franqueados que operam as unidades da marca no país. Hoje, são 170 lojas em 19 países, como Estados Unidos, França, Japão e Índia.
Rinkevicius conta que trazer a marca ao Brasil foi uma questão de gosto. “Eu gosto e sempre fui cliente. Tive uma oportunidade de falar com eles em 2009 e fiquei negociando até então”, diz.
Com três unidades abertas, o empresário acredita que este mercado está só começando a se desenvolver no país. “O pão artesanal está começando e ainda tem muito espaço em São Paulo”, explica. No próximo ano, ele calcula inaugurar mais cinco unidades, possivelmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. O investimento de cada unidade, segundo Rinkevicius, é de 1 milhão de reais.
Marie-Madeleine: consultoria francesa
Aberta em 2010, a padaria e confeitaria Marie-Madeleine foi criada pela chef Izabel Pereira da Silva, com consultoria do padeiro francês Jean-Louis Clément. Sem uso de fermento químico, os croissants são os mais pedidos pela clientela. “Tem uma sala climatizada só para abrir essa massa e a manteiga tem que se importada, porque a nacional infelizmente tem muita água e não deixa a massa tão folheada”, explica Priscila Choe, gerente comercial.
A produção artesanal exige mão de obra e equipamentos especializados. Segundo ela, a máquina que auxilia na fermentação natural chega a custar 10 mil reais. Uma padaria pequena precisa de, pelo menos, 5 equipamentos. “As padarias conseguem, com fermento químico, fazer o pão crescer em 1 hora e já colocar tudo no forno. A gente precisa de um equipamento, a fermentadora, depois tem que colocar todos os pães para secar, fazer o corte e só aí vai para o forno”, conta.
Segundo Priscila, abrir um negócio deste tipo exige “um bom investidor” do lado. “O investimento inclui quase 40 dias de portas fechadas para poder ter padronização”, diz. Para ela, a abertura de novas padarias do tipo dá certeza de que o mercado está crescendo. “A gente vê como uma valorização desse produto”, afirma.
PAO: artesanal e orgânica
Aberta em 2007, a Pao (sigla para Padaria Artesanal Orgânica) foi uma das primeiras a investir neste tipo de produção. “Hoje, 90% da nossa matéria-prima é orgânica”, diz Bruno Rosa, sócio da empresa. Com cinco unidades, a rede investe na abertura de novas lojas. “A gente quer fechar o ano com seis e chegar a 12 no ano que vem. Nosso objetivo é ter uma loja em cada bairro nobre de São Paulo”, conta. O principal desafio para o crescimento ainda é mão de obra, segundo o empresário. “Achar o funcionário que caiba no orçamento e que veste a camisa é complicado”, diz.
Para ele, que toca o negócio junto com o irmão Rafael, houve uma mudança gritante no mercado. “O número de consumidores aumentou e o de padarias artesanais também. Estão surgindo opções legais e tem para todo gosto.”, explica. Segundo Rosa, o investimento em uma padaria chega a 400 mil reais. Entre as estratégias para expandir, a empresa está firmando parcerias para se instalar dentro de lojas, como acontece com a unidade no spa L’Occitane, na capital paulista
Julice Boulangère: clima parisiense
Desde fevereiro do ano passado, a Julice Boulangère, comandada pela chef Julice Vaz, produz e comercializa pães artesanais sem fermento químico em um sobrado na Vila Madalena, zona oeste da capital paulista. A casa é um espaço para degustar café da manhã com direito a pães com geleias, brioches, bolos e frutas. Antes de abrir a padaria, Julice, que é formada em letras e filosofia da arte, testou as receitas de pães e bolos, durante um ano e meio. O investimento para a abertura da casa, segundo ela, foi acima de um milhão de reais.
O sucesso veio antes do planejado. “A gente tinha uma expectativa de faturamento nos primeiros 12 meses e atingimos em seis meses”, explica Julice. O pão de linhaça com castanha do pará é o mais vendido no local. Em média, ela usa duas toneladas de farinha por mês para fazer os produtos do cardápio, como baguetes e pães ciabatta com mortadela e pistache.
Futuramente, a casa também oferecerá pães orgânicos para aumentar a receita. Além disso, Julice afirma que existe o plano para a abertura de uma segunda unidade, mas ainda não tem local definido. Para ela, as principais dificuldades de abrir um negócio neste mercado é a falta de mão de obra qualificada e uma farinha de melhor qualidade.
A micropadaria Mr. Baker, inaugurada no final de junho deste ano, no bairro Itaim Bibi, em São Paulo, é especializada na venda de pães e investe em produtos com matéria-prima orgânica. Dennis Freeman, um dos responsáveis pelo negócio, conta que não são todos os produtos da casa que são orgânicos, mas a ideia é levar para o cliente pães e lanches saudáveis e apetitosos.
O padeiro da casa é o Gilson Santos, também sócio da Mr. Baker. Santos morou durante dois anos em Bruxelas e, de lá, trouxe receitas com produtos integrais. No cardápio, há mais de 50 tipos de pães e diariamente ficam expostos de 25 a 30 tipos diferentes. Para o primeiro ano da padaria, Freeman afirma que a meta dos sócios é se concentrar no negócio e montar um time afiado. Para incrementar a receita, a empresa aposta em cafés orgânicos importados da França, Índia e África.
Fonte: Exame